Quarta-feira, 21 de Janeiro de 2009

inferência das coincidências

 

Um dos elementos centrais de uma coincidência é ser improvável. Se eu sair pela minha porta de casa e chocar contra o meu vizinho, não chamaríamos a isso uma coincidência, pois é bastante provável que isso aconteça numa base de algum modo regular. Se, por outro lado, eu saísse pela porta de minha casa e chocasse contra o meu primo há muito desaparecido, que voltara do outro lado do mundo, com a sua nova namorada, que por acaso vive também na minha rua, esta ocorrência altamente improvável seria uma coincidência. Contudo, tal como se pode depreender, se algo é demasiado inverosímil ou improvável, tal poderá sugerir não se tratar de uma coincidência. Assim, teremos uma escala de probabilidades: demasiado provável para que se possa chamar coincidência, ou suficientemente improvável para se chamar coincidência, ou demasiado improvável para se poder chamar coincidência. Mas até que ponto as nossas capacidades naturais são adequadas para julgar quando um acontecimento é ou não provável? Vejamos alguns exemplos: se houverem 23 pessoas numa sala, qual será a probabilidade de duas delas fazerem anos no mesmo dia? Muitas pessoas ficam surpreendidas ao saberem que há uma hipótese de 50% de duas dessas pessoas coincidirem no dia de aniversário. Estamos inclinados a racionar que, se houver 367 pessoas, duas delas coincidirão de certeza no aniversário e, portanto, para uma hipótese de 50%, bastará dividir esse número por dois. Assim, terão a expectativa de que, para uma hipótese de 50% de duas pessoas coincidirem no aniversário, teria de haver um grupo de aproximadamente 183 pessoas. Tal é conhecido como o Paradoxo do Aniversário – e é um exemplo famoso de como as pessoas se enganam a calcular probabilidades. Este exemplo parece sugerir que, muitas vezes, pensamos que determinadas situações são mais improváveis do que realmente o são. Tal como poderá afectar o nosso cálculo quando julgamos que algo é uma espantosa coincidência ou não, bem como quando a vemos como demasiado improvável para ser uma coincidência. Outra forma das nossas intuições fatídicas sobre as probabilidades nos enganarem tem a haver com – e chamemos-lhe assim – a Lei dos Números Verdadeiramente Grandes. Essencialmente, esta lei afirma que, com um número extremamente grande de acontecimentos, surgirão mais acontecimentos altamente improváveis. Por exemplo, se jogarmos póquer durante tempo suficiente, podemos esperar que acabe por ser dada uma mão de cartas perfeitas. Porém, seria altamente improvável que nunca ocorressem acontecimentos tão altamente improváveis!
 
Alguns especialistas em estatística explicam que acontecimentos raros por pessoa ocorrem com alta frequência na presença de um grande número de pessoas. A natureza da verdadeira aleatoriedade, combinada com um grande número doutros acontecimentos, assegura que alguns desses acontecimentos altamente improváveis ocorrerão. Quando avaliamos raciocínios acerca de coincidências aparentes, temos de considerar a tal iminente possibilidade de propensão para a confirmação: essa tendência para ignorar as evidências que contradizem a nossa teoria ou preconceitos, ou para procurar informação que os suporte. O ideal será construirmos hipóteses que sejam falsificáveis e, então depois, procurar falsificá-las. Este simples exercício está também ligado àquilo que acontece quando as pessoas registam coincidências “espantosas”, do tipo que nos faz pensar: – Com a breca! Ouvimos falar e experimentamos uma grande quantidade de acontecimentos todos os dias, mas quando um desses acontecimentos coincide de algum modo com um dos nossos sonhos, pensamentos e imaginações que recentemente experimentámos, então nós reparamos. Nós temos a tendência para ignorar duas considerações: porque falsificariam, ou pelo menos comprometeriam até certo ponto, a notoriedade duma só coincidência. Vejamos: em primeiro lugar, todos os outros diferentes acontecimentos que poderiam, porventura, ter ocorrido e que teriam sido também considerados espantosos. Em segundo lugar, o número de hipóteses que há de experimentarmos algo como coincidente, embora não o façamos. Tendemos também a ignorar o problema das múltiplas probabilidades porque já nos custa bastante acreditar apenas num só improvável, ainda que por vezes seja tão-somente aparente. Reparar em padrões e coincidências é uma capacidade humana muito importante. Muitas das aprendizagens infantis, como a capacidade de aprender uma língua, dependem disso e, da mesma forma, muitas descobertas científicas. Bem vistas as coisas, as coincidências não existem mas, por outro lado, chegam mesmo a existir se for de tal maneira coincidente que só pode mesmo ser uma coincidência. No entanto, se por acaso alguém entender tudo isto que escrevi, isso é sem dúvida uma grande coincidência pois é bastante improvável que alguém entenda o que eu apenas estou aqui a tentar perceber – explanando. Mas, afinal, porque raio acontecem estas coincidências? Se eu não entendo mas alguém diz entender o que acabei de escrever, então só pode estar-me a gozar! Talvez seja apenas uma inferência para a melhor explicação. Ou seja: na verdade, ninguém percebeu, mas pelo menos alguém entendeu qual era o assunto. Bem-hajas (!)
 
Um abraço...
shakermaker

 

para ouvir: Mind Games por John Lennon em Mind Games (1973)
para ver: Funny Games » T.Roth / N.Watts
blogjob por shakermaker às 00:00

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