Quinta-feira, 7 de Fevereiro de 2008

post pouco higiénico

 

Realmente, a linguagem tem destas coisas descabidas. Veja, por exemplo, quando alguém nos aborrece, dizemos-lhe: – Vai-te cagar! Mas na verdade, é agradável ir à casa de banho quando temos vontade. Existe, pois, uma contradição manifesta entre linguagem e biologia, poremos assim as coisas. Para tentar clarificar, analisemos de onde provém a sensação de bem-estar que acompanha o acto de defecar. Se a excreção faz bem é porque actua sobre o sistema nervoso. Ora, nós não temos só um sistema nervoso, mas dois. Um comanda o que se relaciona com a actividade: é o sistema, chamemos-lhe assim, shaker. Mantém o corpo em funcionamento, acelera os batimentos cardíacos, a secreção da adrenalina e um monte de coisas vitais. O outro descontrai apenas o corpo: é o sistema maker. Diminui o ritmo cardíaco e a tensão arterial, etc. Quando nos enervamos, o shaker actua; mas quando nos sentimos bem depois de termos chorado, é graças ao maker. Os dois sistemas estão em constante oposição: daí a defecação. O relaxamento do esfíncter anal exige uma certa descontracção, desencadeando o sistema maker. Contudo, como se opõe ao sistema shaker, este último fica fora de serviço. Segue-se então uma redução do ritmo cardíaco, uma lentificação do coração e ainda uma diminuição da tensão arterial.  A isso chamamos: aliviar a tripa.

 

Porém, há qualquer coisa que não bate certo no que acabei de dizer. Quando alguém tem muito medo, dizemos que “se caga todo”. Mas como podem os esfíncteres relaxar-se? Quando temos cagaço, estamos tudo menos relaxados. Sentimos é vontade de fugir a sete-pés: logo, o sistema que deveria pôr-se em estado de alerta era o shaker, pois é este que gere a acção e a aceleração cardíaca. Como se pode constatar, há aqui uma inegável contradição. Com efeito, quando estamos submetidos a um stress importante, o organismo procura desesperadamente recursos para assegurar, o mais depressa possível, a sua sobrevivência. Então, o sistema shaker é solicitado até aos limites. A tal ponto que tudo se acelera: coração, respiração, todas as funções atingem o paroxismo e o trânsito intestinal não escapa à regra. Tudo se passa como se a digestão, em vez das habituais duas horas, se fizesse em escassos segundos. Podemos questionar a utilidade deste mecanismo mas uma pessoa pôr-se a defecar quando está ameaçada, e precisa de fugir, não é de todo inteligente. Tudo bem, na verdade, corre-se mais depressa com os intestinos vazios, mas também é verdade que o tempo que demora neste acto possa atrasar a fuga e consequentemente facilitar a captura. Por isso, estas considerações biológicas deviam permitir corrigir certas imprecisões semânticas na nossa linguagem (!) 

 

Assim, importa sublinhar que a expressão “vai-te cagar” é polissémica. Por exemplo: num cinema, se um filme estiver a aborrece-lo profundamente, o sistema solicitado na ocasião é o maker – associado à descontracção – o que se assemelha à defecação. Mas se, durante o filme, há um gajo qualquer que não pára de fazer barulho com as pipocas, você tem vontade de lhe apertar o pescoço. Pois é, mas isso activaria o seu sistema shaker. Então, em que é que ficamos? Você está todo borrado mas mesmo assim quer lhe dar porrada? Isso é um abuso linguístico! Seja como for, a linguagem é injusta. Há que alterar os qualificativos que vilipendiam a defecação: actividade que tem o mérito de colocar o homem mais poderoso de cócoras perante a imagem da sua condição animal. Hoje em dia, os prazeres anais são dissimulados pelos tabus sociais. Exemplo: sabendo que o seu amigo no dia anterior queixava-se de cólicas agudas nos intestinos, é natural que quando o reencontre lhe pergunte: – Então, estás melhor da tripa? Porém, não seria de todo descabido se lhe perguntasse se estava melhor do cu. Tudo bem, até nem seria. Só que isso seria uma confrontação desnecessária pois o sujeito, outrora enfermo da tripa, poderia interpretar como uma séria suspeita quanto às suas preferências sexuais. Ou tomam cuidado com o que dizem, ou caguem-se sobre o assunto.

 

Um abraço...

shakermaker

 

para ver: Gone Baby Gone » MorganFreeman
para ouvir: Jigsaw Falling Into Place por Radiohead em In Rainbows
blogjob por shakermaker às 00:00

ISOLAR POST | RECOLHER POST
De Alex a 7 de Fevereiro de 2008 às 00:22
Ora, podemos sempre alterar a expressão para "vai-te diarreiar!". Sempre é algo que nada tem de agradável...
:0)))
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