Sexta-feira, 12 de Dezembro de 2008

cosmética sexual #02

 

Actualmente, não existe nenhum produto de beleza que contenha esperma. Contudo, o boato acerca das suas virtudes dermatológicas talvez provenha de uma confusão respeitante a um certo produto existente em alguns cremes: o espermacete. Foi apelidado de “esperma de baleia”, o que fez com que muitas pessoas pensassem certamente que, para o obter, se masturbavam baleias. Com efeito, não tem nada que ver. O espermacete é um produto contido na cabeça dos cetáceos, mais concretamente do cérebro, e que servia de cera nos produtos de beleza, antes de ser substituído por um produto sintético. Porém, ao juntar estas duas palavras mágicas, “baleia” (para os aspectos naturais) e “esperma” (para a imaginação), o espermacete terá porventura contribuído para a ideia de que o esperma melhorava de facto a pele. Afinal, o espermacete é tão-somente uma substância gordurosa e branca extraída das cacholas dos cachalotes. Finalmente, vemos que as virtudes atribuídas ao esperma se afastam bastante do seu destino original – a fecundação de um óvulo – que por vezes temos tendência a esquecer. Reais ou imaginários, os seus benefícios para a pele acabam por parecer apenas uma encarnação das virtudes mágicas que lhe têm sido atribuídas ao longo dos séculos e consoante as culturas. A ideia de que o esperma é precioso foi-se propagando sem parar, o que, do ponto de vista reprodutivo, é até absurdo, pois basta um único espermatozóide para fecundar um óvulo. E o homem produz diariamente cem milhões! Então, para consolidar essa ideia de que importa não desperdiçar o sémen, foram-lhe atribuídas outras tantas virtudes. 
 
Até meados do século XX, alguns médicos ocidentais redigiram tratados seriíssimos, demonstrando que a masturbação provocava anemia, surdez, debilidade, e mais não digo! Ou seja, se estiver a perder a sua audição, então talvez seja boa ideia parar de espancar o macaco. Ou talvez também seja boa ideia deixar de apertar com tanta força o dito cujo e evitar assim uma maior concentração de sangue no mesmo. E torno a dizer que mais não digo! Encontra-se a mesma ideia na China, porquanto, segundo a filosofia taoista, o homem perde o seu yang quando ejacula pois ao absorver o yin da mulher devido ao gozo que esta lhe causa, o homem é levado a proporcionar-lhe o máximo de prazer, enquanto ele próprio se controla. O que não deixa de ser uma táctica involuntariamente feminista – presume-se. Outro exemplo: vi num canal temático um documentário com uma tribo na Papua Nova Guiné, em que o valor simbólico do esperma transmite-se entre os homens. Assim, todos os jovens adolescentes praticam “felação” num homem mais velho para adquirir essa tal essência que fará deles homens. Bom, no ocidente e nas civilizações modernas, esta prática tem outro nome… Mas, tudo bem, afinal nós também acreditamos no Pai Natal, ainda que mal comparado. Além disso, nós só mamamos no peito das nossas mães e não no… Enfim, adiante. Dizia eu, e como é evidente, esta prática tribal não tem quaisquer fundamentos, pois não há hormonas no esperma e, portanto, ninguém fica mais “viril” se o ingerir – quanto muito, fica apenas com a voz mais grossa. Logo, uma mulher também não corre o risco de ficar barbuda e cabeluda se abusar do sexo oral.
 
Continuando no domínio da nutrição, aproveitemos para analisar a primeira pergunta que qualquer mulher faz a si própria antes de engolir seja o que for: “ – Será que faz engordar?” É verdade que o esperma é rico em proteínas, mas, como só há cinco calorias em cada ejaculação, não há motivo para se preocuparem por ganhar uns quilos a mais. Podemos recusar-nos a engolir porque não gostamos, mas não por estarmos a fazer dieta. Ora, em todos estes mitos, o essencial não reside na possibilidade de o esperma fazer bem a isto ou àquilo. O que conta, sobretudo, é dessa forma emancipá-lo da sua função reprodutiva estrita. De resto, a realidade científica também aponta neste sentido. Por um lado, tornámo-nos capazes de fazer bebés dispensando o esperma, graças à clonagem que permite fecundar um óvulo com qualquer célula do corpo. Inversamente, o esperma descobre mercados que nada têm que ver com a reprodução: a cosmética, claro está. De certa forma, a ciência associa-se cada vez mais à vontade de dotar o esperma de virtudes muito para além da fecundação. Talvez a força da sexualidade seja tão grande que, no fundo, a sua concretização acaba sempre por nos desiludir. Batemo-nos pelo sexo, sofremos, esperamos, vibramos e, afinal, será apenas para isto: penetrar num óvulo cujo aspecto nem sequer conhecemos? Nada disso! É demasiado insignificante. O poder psicológico do esperma é tão forte que não conseguimos evitar em atribuir-lhe outras virtudes fisiológicas, ainda que fantasiadas. É por isso que, da ejaculação facial dos filmes porno ao esperma curativo dos porcos transgénicos, no fundo a ambição é a mesma: concretizar a velha fantasia dum esperma poderoso. Não, o esperma não faz bem à pele mas seguramente também não faz mal. Mas, cuidado, pode vazar uma vista (!)
 
Um abraço...
shakermaker

 

para ver: Face/Off » J.Travolta / N.Cage
para ouvir: Suck My Kiss por RedHotChiliPeppers em Blood Sugar Sex Magik
blogjob por shakermaker às 00:00

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